sábado, 9 de outubro de 2010

Gaivotas em Terra


As últimas vezes que escrevi artigos no trecolarecos foram para falar de coisas desagradáveis, contrariando a ideia de o fazer num tom de brincadeira  e sobre tudo o que me viesse à cabeça. Mas as circunstâncias não deixam, cá estou de novo.
Em Maio, admitindo finalmente que existia uma crise, o governo manifestou a intenção de criar um pacote de medidas excepcionais para resolver os problemas financeiros do país até ao final de 2011. Precisava para isso de apoio parlamentar, o que conseguiu (à luz do superior interesse da nação) levando o responsável do partido que votou favoravelmente as medidas a pedir desculpa ao país por as viabilizar.
Poucos meses depois o mesmo governo vem outra vez dizer a mesma coisa, agora envolvendo a necessidade de medidas de muito maior dramatismo.
O PSD declarou que só viabilizaria um novo pacote de austeridade se não se aumentasse outra vez a carga fiscal sobre os portugueses, agindo antes na despesa.
O executivo, perante essa declaração, anunciou de imediato um conjunto de medidas para o OE de 2011 que prevê novo aumento do IVA, e que reduz os salários da função pública a partir de três ordenados mínimos de 3 a 10% máximos.
Isto configura um beco quase sem saída. Tantas gaivotas em terra que nem se vêem as nuvens.
Já se tinha desconfiado quando há um ano o défice era de 3% antes das eleições e algumas semanas depois passava a mais do dobro; a mentira escondia um país moribundo.
Este primeiro ministro está no cargo há cerca de seis anos e porconseguinte revelou-se absolutamente imcompetente.
E agora?
Para mim o aumento do IVA seria um erro gravíssimo. Já o tinha dito há uns meses.
A lógica do governo é o imediatismo da medida, mas esquece-se de pensar! O fluxo de dinheiro é como uma estrutura com água: muitos canos, uns fininhos, outros mais grossos, tubagens centrais, caixas de passagem, etc.. A água disponível no sistema (para talvez 70/80% da população) não aumenta só por se abrir mais uns furinhos. Esta maioria de pessoas vive com até dois ordenados mínimos, e nestas circunstâncias a disponibilidade para gastar será a mesma. Aumenta o IVA 2% (outra vez!) mas as pessoas continuam a gastar o mesmo. Toda a estrutura de comércio e serviços vai assim entregar só mais um bocadinho de IVA o que distrai os distraídos, vendendo menos e portanto agravando-se a sua situação. Todo a actividade retrai.
As pessoas vão viver pior, as empresas vão ficar pior, continuando a fechar e vai aumentar ou manter-se o brutal desemprego existente. 
O Estado vai iludir-se durante alguns - poucos - meses porque entrou mais um bocadinho de dinheiro.
Quanto à redução de salários as medidas são perfeitamente justificáveis mas deviam ter sido tomadas há pelo menos três anos, sem o desconforto e provável contestação que agora vai existir, e com um esforço que nesse momento poderia ter sido de 1/3 ou metade do agora anunciado.
E porque é que são só os funcionários públicos a serem abrangidos? Baixar os salários será inconstitucional, mas então poderia ser feito o equivalente nos escalões do IRS. Na função pública era na prática a mesma coisa, e o sector privado era também abrangido.

E agora?
O cenário que prefiro será a proposta de medidas na despesa que compensem o aumento do IVA, que seria assim anulado. Se isto não for possível estarei em desacordo com quaisquer partidos que viabilizem as propostas que por enquanto se conhecem, e prefiria que o nosso primeiro ministro se demitisse e que o PR formasse um governo de transição.
Encontrem-se soluções que não tentem ir buscar o dinheiro aonde não existe, e construa-se um plano nacional de desenvolvimento, uma estratégia.
Faça-se habilidosamente (o menos possível de atritos) um plano que refunde a ética e a eficiência do Estado. Meta-se essa gente toda numa casa até existir um acordo para as leis serem viabilizadas no parlamento sem ruído.
Agora!

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Surpreendente... ou nem por isso


Os incêndios
Para começar este rol de coisas que me perturbam, aí estão de novo os incêndios, uma das que me irrita particularmente, nomeadamente quando se tenta criar a ideia de que resultam em grande maioria de accão criminosa.
Se considerarmos acção criminosa deitar beatas de cigarro pela janela dos carros, garrafas, fazer fogueiras, não limpar as florestas e o chamado "mato"... então sim!
Claro que depois há que somar a todos estes "crimes" os fogos postos, sejam eles por taras ou demências sejam por vinganças ou mesmo por motivos de negócio. Tudo isto existe!
Mas sempre que uma pessoa responsável e conhecedora do que está a dizer refere que a origem dos incêndios não é natural num dia com centenas de ignições, está a conduzir - na minha opinião - para a ideia errada de que a maioria foram fogos postos.
Deve claramente ser dito ao país que:
• Estão condições meteorológicas limite, com temperaturas extremas e com indíces de humidade no ar baixíssimos, uma vez que todo o território está com ar de trajecto continental.
• Os pinhais florestas e bosques não foram convenienetemente limpos (as árvores e a vegetação mais rasteira e anual portanto completamente seca).
• Não tem existido uma campanha eficaz para alterar os comportamentos das pessoas (a causa principal).
• Os nossos meios de combate aos incêndios serão - enquanto país com poucos recursos - escassos.



Scuts
A história das auto-estradas em que não se pagava, denominadas de "Sem Custos para os Utentes", tinha nascido - precisamente pelo conceito - torta!
Recentemente a "gestão do condomínio" tinha resolvido que se passava a pagar e depois ainda que o que faria sentido seria não se pagar só em áreas com rendimento per capita abaixo de x...!
O senhor "primeiro" (com letra pequenina) quer assim um sistema em que os que vivem muito mal nas zonas globalmente com maior rendimento per capita paguem este tipo de vias (e outras coisas, porque não?) e que as pessoas com poder de compra muito acima da média, que vivam nas zonas globalmente com menor rendimento per capita não paguem!.
Como é que é possível aguentar esta absoluta incoerência?
A diferença de contributo para o estado (carga fiscal suportada) deve resultar da especificidade individual dos rendimentos dos indivíduos.

O que o senhor "primeiro" devia ter resolvido - não resolveu, agravou - é a capacidade dos cidadãos para pagar a utilização das vias especiais.


Freeport - A janela de oportunidade
Depois de um ano de empolgada "marcação em cima" por parte da comunicação social ao caso Freeport foi finalmente conhecida a decisão de levar a julgamento os dois sócios da consultora que protagonizou o pretenso caso de corrupção com o nosso "primeiro". Sempre achei que o inglês e o outro tinham utilizado uma janela de oportunidade para à luz de corrupção inexistente encherem os bolsos. Só que a janela de oportunidade veio a ser "primeiro" do rectângulo.
Não consigo perceber a comunicação social, que depois de tanto empolgamento não conseguiu adiantar nada sobre o que os constituídos arguidos declararam, porque das duas uma, ou mantém que deram o dinheiro a alguém supostamente relacionado com o "primeiro" para obter favores no licenciamento, ou então dão o dito por não dito assumindo a extorsão.
Uma destas posições tem de estar em princípio em cima da mesa.
Também já ouvi dizer que no despacho são referidas vinte e tal perguntas que deveriam ter sido ser colocadas ao "primeiro" mas... que não houve tempo.

domingo, 23 de maio de 2010

Só com o nariz de fora (os mais altos)

Da última vez que escrevi umas linhas no trecolareco falava sobre a "acção directa" - termo popularizado por um deputado, e no perigo de ser uma manobra de treino daquela rapaziada.
Aí está!
O tal deputado saiu de circulação - são as técnicas/ciência do marketing político - daqui por duas semanas, três dias e dezasseis horas pode voltar "limpinho" que já ninguém se lembra.
Com esta coisa do aumento do IVA vai passar-se o mesmo.
Sejamos claros, o aumento do IVA destina-se a criar condições para que a nossa situação de queda no abismo se inverta. Para isso acontecer, para além de ser necessário reunir no imediato moedinhas é necessário e mais importante ainda começar a gerar mais riqueza, e a gastar menos.
A minha convicção é que o aumento do IVA vai no imediato reunir as moedinhas, mas vai deprimir ainda mais o funcionamento do mercado e por conseguinte da riqueza e como reflexo da economia.
Devíamos acompanhar o resultado destes aumentos, ou seja saber se o Estado vai conseguir:
- Fazer crecer em 20% a receita de IVA à nova taxa de 6%
- Fazer crescer em 8,33% a receita de IVA de 13%
- Fazer crescer em 5% a receita de IVA da taxa de 21%
Importa assim perceber se o consumo vai ser o mesmo, ou se os portugueses - como eu acho - vão maioritariamente gastar o mesmo, comendo menos, saindo menos ao fim de semana, indo menos ao café, comprando menos roupa, poupando... nada.
Se as receitas fiscais com o IVA não crescerem o que atrás refiro - 20% 8%e 5% , isso significa que mesmo que reunam no imediato mais moedinhas, a dinâmica que gera trocas e riqueza vai pelo contrário cair, se é que ainda é possível mais.
No pântano que outrora dava pelos joelhos agora vêem-se de fora só alguns narizes.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Acção directa

Na outra semana passou na televisão um documentário sobre carteiristas. Devia ter também como objectivo para além da vertente informativa a prevenção, porque a própria polícia permitiu a divulgação de imagens (acho que todas em Lisboa) dos ditos em actividade. É malta muito profissional: um encosto na entrada para o metro, um pedido de desculpas cordato, com a mãozinha nas costas e... a carteira "já era"!
Depois revemos as imagens em câmara lenta e lá está: no momento do encosto acidental a maõzinha rápida vai ao bolso do encostado de forma surpreendentemente ágil, como prestigitador profisional, manipulador de cartas e objectos.
No finalzinho da semana, fui surpreendido com mais uma cena semelhante, só que desta vez em pleno parlamento! Esta malta está afoita.
Primeiro não percebi - tinha a televisão sem som - e só depois quando passaram (a tal técnica) as imagens em câmara lenta deu para ver a subtileza do gesto, o à vontade com que depois de agarrados os objectos - como quem passa a mão pela mesa e diz: pronto vou-me embora - se levanta levando então a mão ao bolso (já recheada) em postura decontraída.
O mais estranho desta actuação em comparação com as outras é que nas primeiras a rapaziada das carteiras não sabe que está a ser filmada, mas nesta última sabe!
Falta-lhes ainda o calo.
Será que dada a crise (a tal que não deve afectar Portugal) estão a preparar esta gente para ir ainda mais longe. Eles bem dizem que tudo farão...

domingo, 25 de abril de 2010

Reviver o Passado no Túnel do Rossio

Esta última terça-feira, foi um dia memorável. Tive uma reunião no Terreiro do Paço, e resolvi recorrer aos transportes públicos apanhando o comboio da Linha de Sintra em Massamá.
Estava um sol simpático, um dia primaveril e lá fui eu!
A primeira grande surpresa foi ter descoberto que para muitas pessoas a modernidade pode significar a impossibilidade de tirarem bilhete: A estação está em reconstrução e aparentemente não existe bilheteira, as máquinas de venda automática implicam algum à vontade com as novas tecnologias, para além de que estão viradas a sul, ou seja ao sol, e quase não se vê. A minha mãe voltava para trás e o mesmo aconteceria com uma parte significativa da população.
Nos últimos... talvez trinta anos, utilizei o comboio duas ou três vezes, e nunca até ao Rossio, pelo que foi com emoção que revivi esse percurso, que sem ser a Linha do Tua também tem a capacidade de avivar memórias, especialmente o trajecto final do túnel, marcante pela sonoridade própria do ruído matraqueante sobre os carris, e pelo breu repentino que transmite a sensação de sairmos por momentos para uma outra dimensão de que regressamos com a chegada ao coração de Lisboa.
Em semana de "25 de Abril", recordei-me dessa manhã de 1974: na altura eu fazia o percurso Amadora - Rossio todos os dias porque andava a estudar no Colégio Académico nos Anjos; um amigo e colega, o Vitor Ferreira, ligou-me talvez perto das oito a dar a notícia: há uma revolução!
Por esse tempo com dezoito anos, já tinha alguma consciência política, já era contra a situação, já contestava as regras autoritárias e cinzentas que minavam a vida das pessoas, já lamentava o isolamento do país, já fugira da polícia numa manifestação no Rossio uns meses antes, e o mesmo numa reunião (arriscada) do MDP-CDE na Amadora!
Por isso, para além da exaltação de qualquer coisa que de repente rasga o quotidiano, percebi o que estava a acontecer. Encontrámo-nos todos - um grupo de amigos - na Minabela, o café onde baseávamos o nosso relacionamento, e não resistimos: depois de almoço, contrariando a prudência e os avisos, e respondendo ao apelo da euforia fomos para a baixa! O ambiente era o que vemos nos filmes a preto e branco: populares a gritar, a encorajar, a participar, soldados armados, tanques, tensão, incerteza... e eu estava lá! Na António Maria Cardoso, junto à sede da Pide DGS o ambiente era especialmente tenso: muita gente, muita tropa, um murmúrio permanente. Quando cheguei a alguns metros do local, talvez um prédio abaixo do lado contrário, houvem-se tiros! Empurrei a porta do prédio e corri escada acima até ao último piso; fui seguido por uma outra pessoa qualquer. Ficámos sempre em silêncio, ofegantes, atentos. O meu coração batia acelaradamente. Depois fomos descendo lenta e prudentemente, de ouvidos alerta, de novo até ao rés-do-chão. Estive ali um bocado, espreitando e entrando consecutivamente, até perceber que podia sair. Desci a rua como quem foge do diabo, procurei os meus amigos, e depois regressei - um bocadinho de rabo entre as pernas, como cão assustado - ao aconchego de casa.
Hoje, quando cheguei a Massamá estava inesperadamente a chover!
Debaixo de umas arcadas acotovelava-se um grupo de pessoas apanhadas desprevenidas pela mudança súbita das condições climatéricas.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Olá trecolarecos!

Olá trecolarecos!
Estamos por cá e por cá estaremos, mas nem sempre é fácil alinhavar linhas e ideias. Para já ficam as primeiras, no final de um dia que espremido deu de positivo a audição do novo cd do Pedro Abrunho. Regresso às guitarradas e um som mais próximo das origens. Na 1ª audição, no carro e a saltar de faixa para faixa, não foi arrasador mas valeu a pena. Canção de embalar na última faixa super catita. Ouvir com mais atenção.

domingo, 18 de abril de 2010

A natureza das coisas

Trecolarecos
Desde que começou o trecolarecos nunca tinha estado tanto tempo sem escrever umas linhas. Compreende-se, mas acho que o vou continuar (é! estava em reflexão). Mesmo tendo nascido nos calores dos momentos inflamados e à luz de um colectivo, e vendo-o praticamente orfão reconheço-o ainda assim mais crescidinho, quase com vontade própria, e por isso tenho de tratar dele. E ele merece.
Não deixará o espírito plural, e quanto ao futuro logo se vê! Pode até ficar mais... aberto!

Nuvens
A semana está a ser dominda pela nuvem de cinzas vulcânicas com origem na Islândia, que de repente paralisou o mundo europeu que anda sempre a "dar ar à pluma". No inícío ouvi pessoas que se mostravam indignadas com o facto de estarem retidas, porque tinham compromissos um ou dois dias depois.
Tratando-se da natureza podem esperar sentadas.
Claro que era uma precipitação, mas agora todos os que são afectados pela situação mostram um estado de espírito positivo. Na verdade, quanto ao mais elementar da vida nada é determinável, nada é seguro, tudo é resultado da permanente transformação que é a própria natureza.
Se pensarmos que somos mais do que realmente somos corremos o risco de nos perdermos.

Emoções
Faltam poucas horas para o Benfica jogar em Coimbra com a Académica, e já estou com a atenção, a perturbação, a intranquilidade e a impaciência do costume. Parece que estou a falar agora das coisas não importantes mas não é assim: realizamo-nos na bricadeira, no jogo, nas emoções, na disputa.
Se ganharmos ou empatarmos o "Puerto" já não é "campiom" este ano. Primeira e capital vitória. (cá está: capital... até lhes dói).
Se isso acontecer (ganhar ou empatar) ficamos com quatro ou seis pontos de vantagem sobre o segundo a três jogos do fim do campeonato.
Se por um acaso da... natureza perdessemos (ocorrência rara), a partir das 20h sintonizava o National Geographic ou o Odisseia, e amanhã de manhã o meu posto de rádio seria a Antena 2.
Mas não. Vamos ganhar!

domingo, 28 de março de 2010

Que Luz!

Esta semana foi fértil em coisas em que apetece falar. No desporto o assunto do denominado túnel da Luz revela que as leis que regulam a justiça desportiva da Liga são absolutamente ineficazes.
Como é que um determinado acontecimento pode ter exclusivamente duas possibilidades de enquadramento para efeitos de punição, e que dão origem a três e quatro jogos numa opção e a a quatro e seis meses de castigo na outra? É inacreditável e a responsabilidade tem de ser atribuída a quam validou a repectiva legislação.
Repito: um acontecimento, duas possibilidades de enquadramento, 500%, 600% 700% ou mais de amplitude no castigo a aplicar. E como se isto não bastasse, a legislação permite que exista a suspensão temporária de meses, quando existia a possibilidade de enquadrar a coisa em três e quatro jogos. É brilhante.
Pareceu-me desde logo que os meses de punição do acórdão da Liga eram excessivos, mas muito mais claramente me parecem inconsistentes os três e quatro jogos agora anunciados pela federação em última instância. Está tudo doido, como custuma dizer o AJJ.
Mudando de ares, e por falar em ar, ontem dia da vitória do meu Benfiquinha sobre o Braga foi dia de assinalar a necessidade de poupança de energia, com iniciativas em várias partes do mundo e também por cá: apagão de monumentos e zonas iluminadas das grandes cidades, e apagão em casa dos cidadãos. Hoje está tudo "normalizado".
Sugestão ao Estado: Anunciem que na iluminação dos monumentos e iluminações públicas decorativas se vai reduzir o tempo de funcionamento em 10%. Anunciem que todos os cidadãos, por cada 1% de poupança anual, pagam menos 1% no valor da energia até ao limite de 10%. 
Reconheço que existe hoje uma consciência nesta matéria, mas o que é necessário é objectividade e eficácia.